Benoît Hamon, o emergente socialista francês que quer impostos dos robôs
Reportagem: Carlos Yárnoz
Vencedor do primeiro turno das primárias socialistas sempre esteve na ala crítica do partido
Até domingo, Benoît Hamon, de 49 anos, era um político
permanentemente insatisfeito dentro do Partido Socialista francês, no
qual milita desde os 19. Sempre na ala crítica, apenas dois meses depois
de firmar duas moções de censura contra seu primeiro-ministro Manuel Valls,
ele se transformou em seu único rival para ser o candidato da esquerda
ao Eliseu, depois de vencer o primeiro turno das primárias. “É o
primeiro tijolo para reconstruir a esquerda”, afirma.
Também desta vez tudo indicava que Hamon ficaria na
oposição. As pesquisas coincidiam em que seria o terceiro homem na
corrida, depois de Valls e do ex-ministro Arnaud Montebourg, também da
ala esquerda do partido. A história dos três seguiu um caminho político
coincidente durante muitos anos. Foram aliados-chave. Algumas vezes, o
chefe era Valls. Em outras, Montebourg. Hamon, nunca. Até domingo.
Ex-ministro
da Economia Social e da Educação entre 2012 e 2014, Hamon conseguiu
este triunfo inicial com um discurso duro, anticapitalista, próximo
daqueles dos dirigentes antissistema. Fala com frequência sobre a
“tensão entre o povo e as elites” ou a confusão entre lobbies e Governos, e abomina o culto sagrado ao crescimento sem fim.
“O crescimento do PIB é uma convenção, mas a riqueza não
reflete o bem-estar, o nível de desenvolvimento, as desigualdades... A
corrida permanente pelo consumo nos leva à catástrofe. O crescimento
permanente é um mito. Por ele sacrificamos nossos direitos sociais e
nossos recursos naturais.”
O “ecossocialista” ou “ecologista social”, como se define,
tem pouco a ver com seu antigo aliado, Valls, que se qualifica como
“reformista social”. A medida de destaque agora defendida por Hamon
consiste em estabelecer um salário social universal de pelo menos 600
euros (2.040 reais) para os maiores de 25 anos. “De onde vai sair esse
dinheiro?”, lhe cutucaram seus rivais nas primárias. “Do mesmo lugar de
onde saíram os 40 bilhões que este Governo deu às empresas”, respondeu.
O programa de Hamon
- Salário social universal. Dar pelo menos 600 euros para os maiores de 18 anos. Mais em frente, 750.
- Reforma trabalhista. Quer revogá-la.
- Imposto sobre os robôs.
- Legalização da maconha.
- Vistos para refugiados.
Mas tem outras opções mais imaginativas. Por exemplo, quer
tributar os robôs. “Se uma máquina substitui um homem e cria riqueza,
não há motivo algum para que essa riqueza não seja onerada com
impostos.”
Protecionista, intervencionista e muito crítico da política
europeia, Hamon fez declarações em favor da nacionalização de bancos,
abomina a austeridade e é partidário de frear o câmbio livre. Quer dar
vistos aos refugiados, quase sem controle, defende legalizar a maconha e
a eutanásia e votou “não” em 2005 no referendo sobre a malograda
Constituição Europeia.
“Precisamos de uma Europa que defenda mais os cidadãos. É
preciso reforçar as fronteiras externas da UE, não a das nações. O
déficit vale pouco frente ao risco de Marine Le Pen.”
Filho de um engenheiro e uma secretária, Hamon foi educado
em um colégio católico em Finisterre e nunca renunciou a seus princípios
religiosos, apesar de estar sempre na ala radical da esquerda. “A
religião é uma riqueza”, costuma repetir.
Encaixado em 1992 no dissidente movimento juvenil socialista
pilotado por um tal Manuel Valls, Hamon começou a andar de braços dados
com a cúpula do PS. Deu um passo-chave ao se integrar ao gabinete de
Martine Aubry, então ministra do Trabalho e líder visível do movimento
rebelde contra François Hollande
nesta legislatura. Aubry se tornou hoje um apoio fundamental de Hamon
para o segundo turno das primárias, no dia 29. Os dois atuaram em
harmonia nestes anos.
Porta-voz do partido com Aubry como dirigente em 2008,
eurodeputado, vereador, conselheiro na região de Paris...., Hamon deu um
passo crucial em sua careira quando Hollande o inseriu no Governo como
ministro da Economia Social. Concluíram seu ataque em março de 2014, em
coordenação com Hollande. Valls ascendeu a primeiro-ministro, Montebourg
ficou com a pasta da Economia e Hamon, com a da Educação.
Mas as alianças em política duram pouco. Cinco meses depois,
Hollande e Valls afastaram do Executivo Hamon e Montebourg, críticos da
“guinada liberal” do presidente e do chefe do Governo.
Desde então, as espadas continuaram erguidas e nestes dias assistimos à batalha decisiva.
Disponível: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/23/internacional/1485175457_353028.html?rel=mas. Acesso: 01-12-17
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